quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Mora na Filosofia

É difícil mesurar a real importância dos blogs para o jornalismo cultural, em especial o jornalismo musical, dado a achismos, a interpretações excessivamente subjetivas, a camaradagem entre artistas, e mesmo dentre a grande imprensa, pouco afeito a pesquisas históricas, análises e compreensões de fatos. Há uma ânsia pelo imediato, uma quase promiscuidade juvenil de parte da imprensa (e acompanhada pelo deslumbramento de alguns blogueiros mais jovens), que teima em ignorar a rica história do país e insiste em apostar em artistas esdrúxulos, num desesperado brainstorm musical.

Deve-se, porém, ter em mente que se de um lado temos a infrutífera busca por novos valores no cenário musical sendo quase sempre realizada de maneira desordenada e com poucos critérios pelos jornalistas mais jovens, é preciso também enfatizar certo – na falta de expressão melhor - desleixo da crítica remanescente do último período de brilho da música popular brasileira, aquele que compreende os anos de 1958 e 1972, entre o surgimento da bossa nova e o fim do Tropicalismo, com as novas expressões da música do país.

[Obviamente, é compreensível que esperar análises profundas e detalhadas de Ruy Castro, Tárik de Souza, Zuza Homem de Mello ou qualquer outro pesquisador musical com mais de sessenta anos sobre o fenômeno de internet Mallu Magalhães ou o sucesso emo do NX Zero seria um despropósito. Não custa, no entanto, citar Nelson Motta e seus jovens colaboradores do site Sintonia Fina, que sempre apresentam novas e boas dicas em seus informativos.]
Nota-se, portanto, enorme descuido da atual geração de jornalistas – salvo gratas exceções; Pedro Alexandre Sanches, na Carta Capital, e Marcus Preto, da Rolling Stone, e alguns outros – com o conhecimento histórico necessário a profissão de crítico musical. Claro que é necessário levar em conta as projeções editoriais, o número reduzido de caracteres para expressar longas idéias, além das pressões das agências de notícias, o que muitas vezes impossibilita maior tempo de compreensão do redator para com seu objeto de estudo. Mas é triste constatar que, em um país que tem ao longo dos anos a música como sua maior expressão cultural, fiquemos dependentes dos mesmos artistas e mesmos críticos de quarenta anos atrás.

O poeta e crítico literário T. S. Eliot costumava defender o dever do artista em “envolver ou buscar a consciência do passado” para que “possa continuar a desenvolvê-la ao longo de toda sua carreira”. Acredito que seja esse também o dever do crítico: a compreensão do passado para saber esboçar um presente útil ao prosseguimento da boa tradição da cultura do país. É lição básica, acredito, mas não foi aprendida nas grandes redações de país – e invariavelmente, essa mentalidade imediatista é copiada pela maioria dos blogueiros nacionais. O número de jornalistas que aparentam desconhecer as obras básicas de um Dorival Caymmi, de um Ary Barroso, mas seriam capazes de soletrar todas as letras de um disco do Arctic Monkeys, é maior do que se pensa.

Não se trata de ufanismo ou saudosismo. Vivemos em um mundo livre e democrático, todos tem acesso a suas particularidades e possuem suas predileções. Porém, não me parece aceitável essa negligência com o futuro e com a evolução da música popular do país pela imprensa, notadamente a imprensa paulista. Enquanto o cinema atinge seus melhores índices de sintonia entre público e crítica, há total discordância entre o gosto musical da população, oriundo do funk, do sertanejo universitário, das micaretas, e as predileções estampadas pelos críticos, baseado em reproduzir em campo nacional tendências anglófilas ou publicar textos elogiosos de críticos consagrados a artistas consagrados. Enquanto isso, textos empolgados com a nova geração de talentosos músicos do país, como os publicados na edição de julho da Bravo!, sobre Jonas Sá, Curumin e Nina Becker, passam despercebidos.

O Camisa Amarela é meu projeto pessoal para tentar proporcionar aos futuros leitores essa característica de compreensão e adequação da crítica musical, aliada tanto da modernidade quanto da tradição, e que penso ser rara no jornalismo do país. Claro que, dentro das possibilidades prováveis a um estudante de jornalismo consciente de que ainda há muito o que absorver, tanto da tradição musical quanto o ofício da escrita em si. Como editor da Revista Wave, publicação cultural eletrônica que completou dez edições nesse mês de agosto, pretendi criar aqui um espaço particular pela minha grande paixão pelo jornalismo musical e meu enorme amor pela música popular brasileira. Estarei presente aqui, tecendo comentários exclusivamente sobre o mundo da música, mas peço que confiram minhas opiniões, artigos, reportagens e resenhas sobre assuntos divertos no site da Revista Wave e no meu outro blog. Estabelecer a discussão cultural em um país tão rico quanto o nosso é a motivação que conduz meu caminho.

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